Para fazer parte de determinados mundos, o ser humano precisou seguir certos modelos sociais que foram paulatinamente sendo incorporados a sua rotina. Tal inserção não é algo recente, já que, historicamente, o homem sempre buscou formas de se manter agrupado, em comunidades, até por uma questão de sobrevivência. Este papel de unir pessoas semelhantes, numa cadeia, é exercido, na atualidade, pelas redes sociais. Elas que povoam a internet com suas múltiplas funções, modelos variados e nomes bem distintos, porém, com o mesmo propósito: aproximar pessoas através de mecanismos simples, dos quais com uma simples dedilhada é possível reencontrar aquele amigo esquecido ou parente distante. No entanto, a popularização desses veículos acabou desconfigurando o seu real papel de unificar, criando mundos paralelos, onde os usuários, às vezes isolados, não conseguem distinguir o real do virtual.
A popularização das redes sociais tem atraído um número cada vez maior de indivíduos. Iludem-se aqueles que pensam que as facetas desse mundo são atrativas apenas ao público mais jovial. Adultos e muitos idosos também fazem parte da rede de pessoas conectadas ao magnetismo desse ambiente. No entanto, ao passo que se estreitam as relações virtuais, distanciam-se, por outro lado, as relações sociais restritas ao ambiente familiar, colegial e até mesmo amigacional. As famílias “modernas” não conversam mais entre si. São filhos indomados, pais desorientados, culminando na formação de indivíduos vazios, artificializados, totalmente desconectados do humano que habitam dentro de si. Ao contrário disso, são formadas pessoas mecanizadas, pequenos androides que irão reproduzir o que veem, leem, apreendem e aprendem dentro dessas redes, como verdades absolutas.
Também há na utilização desses veículos uma forma de humanizar aqueles que na vida real não tem vida. O simples ato de curtir e ser curtido, compartilhar e ser compartilhado, faz com que indivíduos mais introspectivos ganhem visibilidade, destacando-se numa cadeia de outros seres sem vida em busca de holofotes para se sentirem ativos e, por fim, vivos. São pessoas tímidas, ou antissociais, que se mostram super populares e comunicativas, a partir do momento que criam um perfil nessas redes. Quem não conhece alguns casos de pessoas introvertidas, pacatas ou altamente isoladas que quando fizeram uma conta nas redes sociais se transformaram por completo? Exemplos não faltam. Há cada vez mais indivíduos que encontram nessa ferramenta a chance de existirem de fato. O problema é quando essa matrix acaba sobrepondo-se a realidade, atingindo a percepção dos dois mundos.
A quantidade de seguidores (“amigos”); a qualidade das fotos, bem como os melhores ângulos delas; o grau de intelectualidade das mensagens que são curtidas e compartilhadas. Tudo isso é avaliado numa escala de importância para mais ou para menos, de acordo com os adornos que enfeitam os milhares de perfis que povoam os campos da internet. Devido a essa fartura, sérios problemas acabam surgindo. Os jovens, por serem mais propensos as vicissitudes da modernidade, tornam-se presas fácies nas mãos de internautas mal intencionados que encontram na ousadia de algumas fotos a chance de aliciar os pueris ao ponto de ampliar os índices de pedofilia e cyberbullying que se proliferam pela net. Além disso, pessoas com baixa autoestima constroem uma falsa ilusão de si mesmas, criando duplas, triplas e múltiplas personalidades, que são álter egos eletrônicos, os quais se manifestam de acordo com os desejos do usuário. Tal atitude é insalubre para ambos os lados, tanto para quem se ilude ao criar personagens de si mesmo, quanto para quem acredita nelas.
Parece que essa cadeia de mentiras é o que alimenta a vida nas redes sociais. As pessoas preferem se enganar, postando coisas que não acreditam, compartilhando mensagens que não traduzem o que elas realmente gostam e curtem de forma demasiada tudo o que é curtido por todos, como forma de sinalizar que elas fazem parte daquele contexto. Há nesses atos a necessidade de pertencimento, de fazer parte deste ou daquele mundo onde todos são inteligentes, bem informados e altamente sociáveis. Tamanha hipnose poderia ter um lado positivo, se pelo menos a metade de todos aqueles que se utilizam das redes sociais todos os dias expressassem genuinamente o seu eu, ao invés de disseminar ideologias encapsuladas em subterfúgios que não correspondem ao âmago dos indivíduos que usufruem dessas redes. Isso pode ser reflexo de uma sociedade doentia, que prefere enganar seus problemas, elaborando escapismos nos quais a representação da vida crua, pode ganhar uma conotação menos dura se receber uma dose de fantasia.
De certa forma, essa postura é o reflexo da carência humana de não estar, nem permanecer, sozinho no mundo. Sabendo disso, talvez o sucesso de tais redes seja justificado, a priori, como algo positivo, pois é uma ferramenta capaz de aproximar pessoas distantes, unificar aqueles que comungam de pensamentos e ideologias semelhantes e ainda dá a chance de popularizar aqueles que na vida real são mais inibidos. Em contrapartida, não se pode desconsiderar que a periculosidade dessas redes reside na desumanização da sociedade, a partir do momento que o virtual mistura-se ou esmaga o mundo real e a pessoa acaba perdendo a sensibilidade de beijar, abraçar, conversar, discutir, festejar, amar, etc., características inatas ao ser humano e que podem ser trancafiadas no corpo como microchips andantes. O homem precisa estar em contato, com outras pessoas para se humanizar e saber que não é superior nem tão pouco inferior a ninguém, mas membro de uma grande árvore genealógica da qual todos somos parentes. Seja esta árvore vegetal, seja cibernética, o que ele não pode é deixar de ser humano.
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