“Pi-pi-pianinho, Ca-ca-caladinho”


A época em que as mulheres ficavam estagnadas aos serviços domésticos pouco a pouco tem se perdido no tempo. Mais dinâmicas, hoje elas trabalham, estudam, cuidam da casa dos filhos e administram a relação conjugal com muita destreza e responsabilidade. Outras são mais modernas e fazem tudo isso sem a intervenção masculina. Devido às mudanças tão drásticas é inevitável não aplaudir o crescimento delas na sociedade, ao passo que tal avanço seja acompanhado assustadoramente por muitos homens, sobretudo por aqueles mais machistas nesse sentido.  Em resposta, o feminismo tenta contrapor-se ao machismo que ditou regras a elas durante séculos, renegando-as ao segundo ou terceiro plano da sociedade. Acontece que a expansão feminina tem realizado um efeito seis por meia dúzia, visto que muitas buscam superioridade ao invés de igualdade e isso tem criado uma cultura perigosa em torno delas. Infelizmente, esse fenômeno tem crescido pelo Brasil, como se as mulheres quisessem vingar, em curto prazo, todos os males que passaram até agora.


Todas as minorias, que compõe a estratificada história da nação brasileira, lutaram durante anos para conquistar seus respectivos espaços na sociedade e, por fim, serem aceitas por esta. O negro enfrentou tudo e até hoje luta para ser visto além da melanina que encobre sua pele. Os homossexuais também desejam desconstruir o preconceito em torno da condição sexual deles, e brigam com unhas e dentes para que isso aconteça. E, neste contexto, as mulheres buscaram equitativos direitos perante uma cultura patriarcal, que minorava o papel delas dentro do lar e na própria esfera social. De todos esses grupos, os maiores avanços foram registrados pelas mulheres. Elas conseguiram desmoronar parte da grande muralha de preconceito em torno do estereótipo frágil e inutilizado que pairava sobre elas. Tal conquista serve de exemplo e impulsiona os demais grupos marginalizados a continuar lutando por um mundo mais justo e aberto ao “diferente”. Nessa trajetória, se antes elas foram silenciadas, hoje elas emudecem os resquícios da cultura machista que ainda tenta prevalecer entre os mais conservadores. Entretanto, até que ponto essa ascensão tem sido positiva?


Quando a revolução feminista aconteceu, tudo o que as mulheres desejavam eram dignidade, igualdade e respeito. Coisas estas que não faziam parte da plena sociedade de direito, a qual era composta e controlada apenas por homens. Os tempos paulatinamente mudaram. Elas conseguiram votar e serem votadas. Determinaram a quantidade de filhos que desejavam ter e os devidos parceiros para este feito. Puderam usar a hiper, mega, super, ultra, minissaia e desfilaram livremente pelas ruas com ela, (mesmo correndo o risco de serem tachadas de vadias ou rótulos do gênero). Ganharam verso, poesia e canção e hoje ocupam cargos inimagináveis em outrora, como a de Presidência da República; em várias partes do mundo. Por tudo isso, embora muitas sofram discriminações e violências diversas, é inegável o avanço delas e a aceitação da sociedade em meio a isso. No entanto, a cultura feminista parece não se contentar com todas essas conquistas e desejam cada vez mais poder. 

Devido a isso, os homens de vilões passam, ou passariam, a serem vítimas de um ambiente dominado por mulheres. Parece engraçado, até meio controverso, mas a expansão da mulher na sociedade conseguiu que, de fato, eles ficassem “caladinhos”. Seja no lar, no trabalho, nas artes, elas mostram uma superioridade tremenda, mesmo que a sociedade ainda finja não reconhecer isso. Mudos, os homens não tiveram muita escolha, se não aceitar as condições impostas pela cultura feminina. E engana-se quem pensa que os perfis sexistas, propagados na infância, foram suficientes para conter as “Girls Just Wanna Have Fun” existentes em cada uma delas. Elas, então, assumem as finanças da casa, gerenciam grandes empresas, casam-se, ou simplesmente amalgamam-se, tem vários relacionamentos, adotam crianças ou as escolhem em laboratórios, usam roupas curtíssimas, falam palavrões, são ousadas, despachadas, inteligentes e donas do próprio nariz. Tudo isso retirando a sensação de posse que esteve nas mãos dos homens durante longos anos.

Ao se falar em cultura feminista, portanto, tem que se pensar em um conjunto de ações desse gênero em torno de estratégias para conter o sexismo ditado pelo histórico patriarcado em várias partes do mundo. Subestimadas pela sua condição sexual, as mulheres amargavam o rótulo de “sexo frágil”, o qual subjugava a sua condição perante a sociedade. Por aqui, para enfrentar o estereótipo da Amélia, elas vêm rebatendo o discurso da “mulher de verdade”, da música do saudoso Mário Lago, e na atualidade se colocam como donas de um discurso autônomo, com canções versadas entre o feminismo e a ousadia. No campo das artes, de várias formas isso vem acontecendo, mas é no terreno musical que elas dominam. Divas, cantoras pops, funkeiras, elas mostram todo o seu potencial com letras impositivas, como se estivessem travando uma guerra contra o sexo oposto. De fato, a representatividade que a música exerce na cultura social se tornou a arma necessária para que as mulheres externassem, além do talento, suas inquietações, revoltas e transgressões. Com isso versos como “sou mais macho que muito homem” e “eu adoro, eu me amarro”, deflagram a efervescência feminina na sociedade. Surge, então, a “Independent Woman”: livre, ousada e transgressora.

Nesse sentido, o que Cyndi Lauper, Beyonce, Rita Lee, Zélia Duncan, e a banda de forró Santropê têm em comum? Simplesmente a imposição feminista disfarçada em letras dançantes e “inofensivas” que, implicitamente enaltecem a mulher e inferiorizam a ala masculina. Multifacetadamente, estas canções têm impregnado na sociedade um discurso do qual a soberania delas se sobrepõe a deles. Frases como “as mulheres estão invadindo os quatro cantos do planeta”, da contagiante banda forrozeira, denotam essa mudança de conduta de papéis na sociedade. Fora do âmbito nacional, recentemente a artista Pop Beyoncé lançou uma canção de cunho semelhante. “Run the World”, como é conhecida, faz uma referência clara a pretensa dominação feminina na sociedade, pois letra e clipe (sem contar as inúmeras apresentações dessa artista) exibem um conglomerado de mulheres fazendo uma clara alusão ao poderio desse gênero em todo o mundo. Para muitos, essa postura é compreensível, visto que durante anos elas sofreram (e ainda sofrem) com os preconceitos herdados e nutridos pela cultura do machismo, que ainda hoje sobrevive fazendo as suas vítimas. Compreensível, sim, mas não aceitável, pois com isso estamos sobrepondo um ismo sobre o outro.


Esta sufixação é conhecida por muitos, pois historicamente tem criado embates entre diversos segmentos sociais: Capitalismo x Comunismo, Ateísmo x Cristianismo, Heterossexualismo x Homossexualismo, dentre outros “ismos”. A sociedade brasileira foi marcada por estas palavras, que tem em comum uma relação polêmica entre a imposição e a patologia. Essa dicotomia também não é diferente com o machismo e o feminismo. Se durante séculos a figura do macho prevaleceu, e até hoje mantem-se viva, agora a fêmea tenta assumir as rédeas, ditar normas e controlar tudo e todos. Nesse redimensionamento de poder, o discurso de igualdade construído pelas mulheres vem perdendo sua força, porque o que muitas desejam vai além da conquista do próprio espaço. Elas querem dominação suprema, os cargos mais altos, os quais a chefia seja utilizada como mecanismo de vingança contra aqueles que as inferiorizaram ao longo do tempo: os homens. Essas “Pagus”, pós-modernas e sem causa, desconhecem o perigo dessa atitude e, sobretudo o quão nocivo é sobrepujar valores tão antigos de forma abrupta.


Isso não quer dizer que elas devam aguardar passivamente as transformações sociais em torno do gênero. As mulheres devem continuar na luta contra o preconceito que as inferiorizam e a discriminação que as limitam. Porém, isso não dá o direito a elas de romper certas barricadas com punho de ferro. Felizmente, muitas batalhas foram vencidas, mas a guerra ainda não. Que o machismo foi o causador de todas as discriminações vividas por elas, isso já se sabe. Agora, dizer que o feminismo não é perigoso é ignorar todos os malefícios daquele sobre este e vice-versa. Em outras palavras, quando se cria um embate entre grupos abre-se um precedente para que outros segmentos marginalizados reivindiquem “direitos” de forma impensada. É o que acontece com as Paradas Gays espalhadas pelo Brasil e mundo afora; com a marcha da maconha, com as passeatas ligadas a temas afrodescendentes e étnicos em geral; e, por fim, a marcha das vadias. Todos são desconsiderados, ou pior, ignorados, porque falta muitas vezes ideologia, senso de pertencimento, e uma postura pautada na igualdade de direitos, fincada e contextualizada com a realidade de cada país e suas respectivas culturas.

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