Transar depois do casamento pode. Perder a virgindade antes disso não pode. Masturbação na adolescência pode. Mas se você for menina não pode. Sentir atração sexual por alguém pode. Manifestar esse desejo em público nem pensar. Levar camisinha na bolsa pode. Só não é permitido deixar ela amostra por aí. Sexo só pode com o gênero oposto, pois o inverso é pecado. Assistir a filmes pornôs pode. Mas ficar animado com cena de sexo no cinema está fora de cogitação. Assumir o gosto pelo sexo pode, porém, colocar isso em prática com várias pessoas é ser assumidamente desavergonhado. Diante de tantos pode e não pode, não é de se surpreender que ainda hoje aja tantos tabus em torno do sexo. A mesma sociedade que busca regozijar-se entre quatro paredes é a mesma que cria os próprios limites em torno do prazer. Com isso, gerações vão perpetuando a ideia de que o sexo deve ser limitado, privado a atmosfera matrimonial. Porém, tudo isso poderia ser diferente se, entre tantas proibições, houvesse a legalização do orgasmo, pois muitos problemas ligados ao sexo seriam previamente solucionados.
Parece irreal, mas muitos dilemas da sexualidade humana estão relacionados ao gozo alheio. Seguindo uma ordem cronológica, é perceptível que isso tenha início já na infância. Numa sociedade onde as crianças são divididas por cores, como representação dos seus gêneros, o resultado é a herança de padrões sexuais limitados. Azul e rosa representam bem mais do que a distinção de gênero neste sentido. Elas representam a sinalização que deverá ser seguida por quem as representa. Ele, o azul, terá cartão livre para se conhecer, tocar e experienciar tudo o que quiser sobre sexo. Já ela, a rosa, não terá a mesma chance. Sua sexualidade será regrada pela delicadeza desta cor. Seu orgasmo será contido, regulado por uma cadeia de sistema que definirá com quem ele poderá ou não transar. Em contraponto a isso, muitos adultos, atraídos pela pureza pueril, aproveitam para erotizar precocemente essas crianças. Ou seja, mesmo sem ter nenhuma noção de orgasmo, muitas delas são comercializadas por aqueles, que vindos de um contexto semelhante, canalizam suas frustrações para quem não tem noção alguma de sexo e sexualidade.
Na adolescência não é muito diferente. Nesta fase da vida, quando os hormônios estão em efervescência, jovens começam a se descobrir sexualmente. Vem aquela vontade instintiva de conhecer o próprio corpo, tocá-lo, sentir as possibilidades que ele oferece. Aliado a isso, vem a menstruação, a barba, os seios, a polução noturna. Entretanto, neste mar de descobertas, a sociedade dá o primeiro de muitos cartões vermelhos ao orgasmo, a partir do momento que segrega o prazer dos meninos e das meninas. Eles são ensinados a serem predadores, insensíveis e cruéis, buscando de forma egoísta o própria gozo independente do alheio. Já elas reprimidas, descobrem o orgasmo de forma errada, são geralmente usadas e se tornam objetos sexuais. Por essa razão, muitos contraem doenças sexualmente transmissíveis, se tornam pais antes do tempo, ou abortam irresponsavelmente, pois não foram devidamente educados a gozar. Ou seja, mais uma vez a falta de orientação sobre orgasmo, prazer em si, fizeram com que mais problemas derivados do sexo surgissem.
Chega a fase adulta, e acredita-se que agora as pessoas serão mais livres para realizar suas fantasias sexuais. Todavia, ocorre o contrário nessa fase da vida. Sem muito diálogo, muitos se frustram logo nas primeiras relações, buscando nos braços alheios a satisfação desejada. Para estes surgem logo os rótulos de infiéis e imorais, apenas porque resolveram realizar suas fantasias nos braços de quem realmente tinha competência para fazê-lo. Porém, aqueles que resolvem aventurar-se ao se relacionar com alguém, precisam de muita liberdade, e certa dose de coragem, para dividir na relação os desejos mais lascivos que estão guardados. Dos dois modos, as pessoas que buscam o orgasmo a todo custo são crucificadas. Se o indivíduo não se contenta apenas com uma só companhia é chamado apontado pela sociedade, se é reprimido dentro desta relação, idem.
Depois de uma longa jornada de privações em torno do sexo, eis que surge a velhice, fase da qual nada mais preocupe, a não ser a saúde. Agora, os indivíduos que foram reprimidos a vida toda a respeito do sexo, podem se manifestar livremente nesse sentido. Ledo engano. É nesse período que a sociedade amplia os tabus em torno do sexo, ratificando aquela máxima de que ele tem prazo de validade e, por isso, deve ser realizado até certo período da vida. Ora, disso tudo é possível encontrar várias incoerências. A primeira, se a velhice é limitada nesse sentido, porque os remédios contra a impotência sexual, conhecidos como azuzinhos, continuam sendo vendidos e elaborados? Segunda, baseado nos estudos científicos, o ser humano, em especial os homens, foi projetado para fazer sexo a vida toda. Então, porque determinar o fim de suas atividades, quando o corpo tem plenas condições de realizar o ato?
As respostas se resumem a palavra tabu. É ele que limita as ações humanas, baseado geralmente em preceitos anacrônicos de certo e errado. Também não há uma naturalização em torno do sexo. O que há é ora uma banalização em torno dele, ora uma proibição, causando inúmeras incoerências e problemáticas sociais. Muitos dilemas nesse sentido, ligados ao prazer humano, poderiam ser solucionados apenas com o maior entendimento do que é o desejo, o sexo e o orgasmo em si. Não apenas uma descrição biológica, mas todo um tratado cultural e sociológico das satisfações sexuais da humanidade. Atrelado a isso, as mesmas bases legais, que são capazes de criar leis contrárias ao sexo e a sexualidade em si, deveriam ser as primeiras a legalizar o orgasmo no Brasil. Aquele realizado sem neura nem bloqueios, apenas o sexo como tem que ser, natural, animal em sua essência. Talvez assim, muitos debates enfadonhos sobre esse ou aqueles assuntos cairiam por terra. Talvez...
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