Há uma incoerência antiga em torno das relações sexuais. O que deveria ser gratuito, é na verdade o produto mais caro do mercado. Isto é o sexo, que desde a antiguidade é consumido como produto e comercializado como tal. As pessoas não aprenderam ainda a trata-lo com a naturalidade que lhe é peculiar e isso deu vazão a atravessadores, que se aproveitam dos tabus alheios para lucrar. Em meio a isso, pessoas são privadas dos seus prazeres, porque a moral e os bons costumes reduziram o sexo à procriação e não ao prazer. Devido a essa redução, indústrias e instituições poderosas ganham muito em torno dessa questão, enquanto a sociedade, que deveria regozijar disso sem bloqueios, é ensinada a ser limitada nesse sentido, quando poderia já ter evoluído no quesito sexo e tudo que gira em seu entorno.
Nas negociatas a respeito do sexo, a história prova que o surgimento da família é, talvez, o marco primário dessa discussão. Quando, por questões meramente econômicas, o homem cria a ideia de família, no período do surgimento da agricultura no mundo, o foco estava na perpetuação dos bens entre os familiares e parentes. Nasce também a ideia de casal, de que ele é dela e ela é dele, como se existisse fidelidade total entre ambos. Porém, a questão maior é que devido a tais mudanças, ao longo da história casamentos foram criados, romances foram escritos, novelas, filmes, e uma série de coisas atrativas foram comercializadas, nas quais além de criar um modelo romanesco clichê, acaba privando o sexo ao matrimônio, ao passo que demoniza quem o pratica fora desses moldes.
Como o ser humano é, por excelência, transgressor, eis que a prostituição surge para afrontar a padronização existente. Ela é antiga. Estudiosos relatam que tal prática data de muito antes da era cristã, mas com nomes e maneiras diferentes em tempo e espaço. Entretanto, há algo que não mudou. Tanto no passado quanto no presente, prostituir-se é um ofício lucrativo. Basta passar em muitas ruas e ver estampadas nas bancas de revistas livros e exemplares especializados nesse gênero. O mundo pornô, responsável pela popularização da prostituição, também invade o campo dos filmes, da mídia aberta e, com o advento da tecnologia, é também disseminado pela rede. Exemplos não faltam, desde filmes como 50 Tons de cinza, passando pelas Brasileirinhas, séries como Gabriela, sites pornográficos diversos, etc.
As ruas também contam com profissionais dispostos a tudo por alguns trocados. São mulheres, homens, travestis, prontos para aliviar as carências dos seus clientes por quantias que variam muito. O sexo é muitas vezes mecânico. Não existe afeto, nem muitos carinhos. Só um enlace de pernas e braços, membros que se encontram e se encaixam para satisfazer suas carências. De um lado pessoas que não encontraram outra alternativa a não ser vender o próprio corpo por dinheiro. Do outro, pessoas infelizes, incompletas e insatisfeitas com as suas vidas sexuais, dispostas a pagar um preço alto para apenas gozar. Sabendo disso, clubes de stripper, de swing, saunas, prostíbulos, puteiros, e uma infinidade de locais emergem do nada para atender a demanda daqueles que preferem a segurança e o sigilo que a rua as vezes não dispõe.
Falar de sexo vendido é lembrar das excentricidades de que muitos são capazes de fazer, apenas para ter poucos minutos de orgasmo. Há poucos anos o Brasil serviu de exemplo para isso, quando uma catarinense resolveu vender a sua virgindade na internet. Na ocasião, uma longa discussão foi feita na rede. Pessoas acharam absurdo que alguém fosse capaz de uma atitude dessas, mas ninguém se choca ao pagar por uma Play Boy, nem por alugar DVDs pornôs para menores, ou por arriscar a vida nas madrugadas atrás de sexo. Coisas essas que são tão excêntricas quanto se vender na net. Ou seja, o que muitas pessoas não perceberam ainda é que todos pagam para fazer sexo, direta ou indiretamente, quando ele deveria ser totalmente filantrópico.
Entretanto, por viver nessas incoerências, a indústria pornográfica é uma das que mais cresce no mundo. Na verdade, ela esbofeteia a cara da sociedade no seguinte tocante: como se aprende a reduzir o prazer a gestação, o sexo só por sexo, sem compromissos nem amarras, choca porque não está dentro do que foi determinado como correto. Ai vem o universo pornô dizer que é possível sim ter prazer, orgasmos diversos, das maneiras mais esdruxulas possíveis, muitas vezes até com mais de uma pessoa. A mídia indiretamente também cumpre um papel semelhante, sobretudo quando coisifica as relações conjugais em suas telenovelas, comerciais de bebidas alcoólicas, Reality Shows, permitindo que o sexo livre seja concretizado, de modo que do outro lado o telespectador, dentro dos seus limites, faça a sua avaliação. É claro que ambos abalam a sociedade mais conservadora, a qual não aprendeu a fazer sexo de graça, mas pagando preços altíssimos para realiza-lo.
Não se pode ignorar também o papel das religiões, sobretudo aquelas de origem cristã. Nelas, temas transversais ao sexo, como aborto, autonomia, prazer, orgasmo, homossexualidade, identidade de gênero, orientação sexual, entre outros, ainda são tratados com muito recato. Há uma repressão sobre tais temas, pois eles desrespeitam os preceitos defendidos por muitas congregações religiosas. Ora, é inegável que não se pode confrontar os pilares de nenhuma religião, por se tratar de espaços com ideologias para muitos sagradas, porém, muitas delas sem notar também lucram com a questão do sexo. Por defender um modelo de vida menos lascivo, muitas religiões galgam fieis prontos para defender e propagar suas ideias, mesmo que isso custe tempo e, em muitos casos, dinheiro. Por isso que se vê hoje muitas igrejas e templos com estruturas colossais, pois são, antes demais nada, fruto da luta delas contra o sexo e sua pluralidade.
Em face a esta questão, há aqueles que rompem com todo esse sistema opressor, defendendo a ideia de um amor livre, livre de leis, regras, das imposições do Estado e da Religião. Por ignorância, muitos classificam como obscenidade, promiscuidade, imoralidade e outras insanidades do gênero. O amor livre, bem como o poliamor, guardadas as suas proporções, são estratégias válidas para desmontar esse comércio imoral do sexo, que precocemente induz as pessoas a pagar por algo que a natureza nunca cobrou: o prazer. Em contrapartida, muito antes de defender a conduta liberal do sexo, é preciso que ele passe a ser ensinado mais naturalmente. É quando a escola se torna imprescindível para a desconstrução de tal tema. A ela cabe naturalizar o sexo, repassando o discurso de que se for feito de forma segura, a pessoa pode e deve conhecer mais de um corpo, antes de decidir se firmar com alguém. Também é papel dela desmistificar os tabus que giram em torno aos temas que resvalam do sexo e de como há pessoas, que por razões diversas, praticam sexo fora do convencional, mas não há nada de anormal nisso.
A anormalidade reside nessa indústria por trás do sexo que faz com que Governo, mídia, mundo pornô e religiões lucrem com o prazer, ou desprazer alheio. Não se pode, após saber disse, perpetuar o sexo fadado ao casamento e a procriação apenas. Quando se faz isso, ignora-se que crianças e adolescentes são explorados sexualmente; pessoas são contaminadas com doenças veneras; mais homens, mulheres e travestis encontram na prostituição uma profissão; a mídia enriquece o seu ibope; o cinema leva mais gente as suas salas cada vez mais cheias; os filmes pornôs passam a ser mais educativos do que prazerosos; buffet de casamentos se proliferam; virgindades continuarão a ser vendidas e corpos serão tratados como objetos, coisa que, infelizmente, já ocorre na prática. Então, sem perceber, um dos maiores prazeres humanos passará a ser disputado na bolsa de valores. Não será surpresa se isso começar amanhã...
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