O despautério em torno do pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro sobre a pandemia do coronavírus segue um script seguido à risca por ele desde sua queda meteórica na política: de se eximir da toda a responsabilidade conferida a seu cargo e transferir a todos a culpa por sua incapacidade e insensibilidade diante desse problema. A cada novo discurso isso é reiterado. A previsibilidade de sua rasa capacidade cognitiva deveria ser capaz de nos preparar para escatológica fala que sai do seu aparelho, por ora, fonador. Entretanto, o mais assustador é o levante feito por seus adoradores para encontrar em um palheiro a agulha que possa alinhavar qualquer coerência o bastante para costurar os retalhos deixados pelo caminho por Bolsonaro. Não são mais céticos, são lunáticos, tão passíveis de internação quanto aquele que eles idolatram.
Na verdade, após o que foi proferido ontem em rede nacional, Bolsonaro deveria no mínimo sofrer sanções públicas por desdenhar da ciência e incitar irresponsavelmente a saída populacional diante desse panorama. É um crime de ódio, oriundo de um discurso raivoso do qual a economia, as alianças com as elites, o enriquecimento dele e de seus corsários, se sobrepõe à vida dos mais vulneráveis. Quem coaduna com tal pensamento é tão fascínora quanto ele, passível de punição dentro dos regimentos legais. Não se trata de posição política apenas, mas de direitos humanos, legitimação científica, empatia pelas dores do próximo, sentimento este em um mundo onde nações como Itália, Espanha, Estados Unidos e China, onde a mortalidade é avassaladora, é encontrado. Contudo, ele e seus devotos seguidores tem uma noção particular sobre humanidade.
Diante disso, a mídia passou a figurar entre os inimigos do governo, em especial a Rede Globo. Tenho minhas considerações sobre essa emissora em muitos aspectos, mas colocá-la como algoz da regência de Bolsonaro é esconder o fato da Rede Record, comandada por outro insano, ser a única porta-voz midiática do chefe de Estado, com claros sintomas de desequilíbrio mental. Assim é fácil usar um canal religioso, claramente alienante e antidemocrático para defender suas asneiras. Todavia, um presidente que se prese não temeria aparecer em qualquer veículo informativo, se a sua capacidade de ocupar tal cargo fosse superior às artimanhas de setores comunicativos. O problema é que Bolsonaro sabe de suas limitações, assim como seus partidários. Apenas o povo, contaminado pelo bolsonavírus, insiste em paliativos para defendê-lo. Entretanto, a resistência nessa defesa é sintomática à ignorância, fazendo com que, por exemplo, algo como o coronavírus seja relativizado.
Além da mídia, a China passou a ser atacada pelos brasileiros infectados pela mutagênico vírus da ignorância injetado por Bolsonaro. Para eles, o coronavírus é o “chinavírus”, desconsiderando o fato comprovado de que a doença existe há décadas, apenas sua mutação se deu naquele país e se expandiu para o mundo. Ou seja, poderia ter sido lá ou em qualquer outra nação. O vírus é uma resposta a sanha humana pelo progresso desenfreado, o mesmo que tem no Brasil devastado as nossas florestas e, no resto do planeta, tem encurtado a vida da natureza. Como resposta, o meio ambiente se defende atacando seus algozes. Todavia, para os patologizantes integrantes da seita bolsonarista não há espaço para preservação. Os verbos que os regem é destruir, arruinar, fechar, ou como profere seu iconoclasta: “tem que acabar com isso aí!”. Então, em uma prática autodestrutiva, muitos não perceberam, ainda, que tais atitudes virão retaliadas contra eles, seja em forma de vírus, ou noutra moléstia socioambiental à saúde de todos.
Em contrapartida, a perplexa retórica indefensável de Bolsonaro chegou ao apogeu de nos expor à morte. É aviltante de quem exerce um poder representativo entre as massas. Vai de encontro a todos os protocolos internacionais em torno dessa pandemia. Até regimes conservadores como a Rússia e o Irã demonstraram mais solidariedade diante desse panorama do que ele. Na contramão de todos, nosso presidente aconselha fiéis (leia-se cristãos) a irem aos seus templos, descredita as recomendações médicas dadas por profissionais preocupados com a insuficiência estrutural do SUS, crítica as medidas dos governadores dos estados cientes da imprudência do Estado frente a tal pandemia e, de quebra, convida a população a saírem de seus confinamentos porque o vírus “só é nocivo aos mais velhos”, frase que por si já diz muito do pouco que nos governa. Tudo isso já seria o bastante para qualquer indivíduo são repudiar à presidência. Mas, porque há quem defenda aquele mentecapto?
Aliança política, golpe, milícias, alienação, interesses religiosos, educação precária, ignorância, distorção discursiva, Fake News, preconceito, intolerâncias, pseudo nacionalismo, embrutecimento social, militarização, armamentismo das massas, idolatria, exclusão das minorias, exaltação da família tradicional, ruralismo, corrupção, interferência virtual, Olavo de Carvalho, perseguição, populismo, elitismo, negação histórica, ditadura, segregação, tirania, escola sem partido, inversão de valores, falácias, ideologia de gênero, kit gay, misoginia, machismo, homofobia, transfobia, Rede Globo, “Golden Shower”, mamadeira de piroca, balbúrdia, Cuba, mais médicos, comunismo, índios, cultura do estupro, naturalização das violências, menino veste azul e menina veste rosa, femicídio, Damares Alves, antidemocracia, Sérgio Moro, inconstitucionalidade, nepotismo, bandido bom é bandido morto, cuspe, Jean Wyllys, afronta a laicidade, Rede Record, Trump, vergonha alheia, paixão, Lula, PT, Freud explica, “gripezinha”, coronavírus, Bolsonavírus.
Em doses homeopáticas, Bolsonaro patologizou grande parte da sociedade. Primeiro pelo seu arquétipo rude, visto como antídoto para a realidade nacional, depois por suas coloquialidades em uma nação denotativamente sem bases intelectuais fortes o bastante para se imunizar da potência viral da retórica bolsonarista. Por isso, os acometidos por essa doença minimizam o coronavírus e asseveram todos os coliformes fecais expelidos em forma de palavra pelo chefe da nação. Certamente, entre eles houve uma substituição do cérebro pelo intestino, um agravo não apenas a anatomia dos corpos, mas, sobretudo, a quem tem o desprazer de presenciar tal escatológica narrativa. Por essa razão, ao devotos da presidência, cegos pelos excrementos que saem de sua boca, apenas replicam irrefletidamente essa pocilga que virou nosso país. Estão chafurdados em algo do qual eu não ousaria me aproximar. Assim, frente a tamanha fé, espero profundamente que tais indivíduos encontrem fôlego nessas palavras para se higienizarem diante da sujeira em que estão mergulhados. Em parte, não é culpa de vocês terem sido fisgados pelas artimanhas políticas do Golpe a atualidade. Somos todos suscetíveis a escolhas erradas, mas podemos fazer o certo quando este se materializa a nossa frente. Porém, se vocês insistem em partilhar de mais essa porcalhada, foi bom chamá-los de humanos um dia. Passem bem!
Comentários
Postar um comentário