O Brasil é conhecido por sua grandiosidade territorial, suas belas praias e exuberante flora, sua musicalidade e suas sinuosas mulheres. Também é conhecido pela diversidade cultural, responsável pela formação de uma sociedade miscigenada, sejam em aspectos étnicos, sociais ou religiosos. De fato, a variedade de formas, cores, sons e credos fazem desse país um oásis no meio da América Latina, criando um rótulo de paraíso nos estrangeiros e um sentimento ufanista nos que aqui residem. No entanto, nesse conto de fadas à brasileira, nem todos têm a oportunidade de terem um final feliz, pois enquanto a economia nacional se multiplica a divisão dela continua restrita nas mãos de poucos.
Como se sabe, o Brasil está crescendo muito rapidamente se comparado aos seus vizinhos latinos. Mesmo com tal constatação, o aquecimento econômico não tem solucionado certos problemas que insistem em desmascarar o “progresso” pelo qual o país está passando. As possibilidades de mudanças sociais ampliaram, mas, a resolução de temas que afligem as pessoas mais carentes como educação, segurança e saúde pública de qualidade, moradia e saneamento básico são assuntos que continuam sem uma solução concisa. Na verdade, o que acontece por aqui é uma sucessão de paliativos que tentam encobrir uma sequência de erros que, infelizmente só atingem as camadas mais pobres da população.
Nessa vida de descaso e esquecimento, não é de se surpreender que a nação sofra com a brutal fúria da desigualdade social. Esta moléstia moderna acabou contribuindo para o surgimento e disseminação de outro problema muito maior e, ao mesmo tempo, muito longe de ser resolvido, à violência. Ela, na verdade, configura-se como o espelho de tudo o que ocorre com as pessoas esquecidas pelo poder público. É também o fenômeno social que se volta, inevitavelmente contra aqueles que contribuíram de alguma forma para a ampliação existente entre os grupos dos mais ricos e dos mais pobres. Ou seja, é um anarquismo transgênico, elaborado não em laboratórios, mas sim na raiva ensanguentada de um povo que não quer viver a revelia da vida. Em outras palavras, as pessoas não querem ser condicionadas a meros serviçais, matéria bruta da burguesia, mas ter as mesmas chances de transformar a sua própria condição de sujeito.
E, enquanto a nação cresce economicamente na visão internacional, com a moeda local valorizada, mais exportações de produtos e com a procura de novas empresas multinacionais interessadas em se instalarem por aqui, a diferença entre ricos e pobres também cresce proporcionalmente. Tudo isso porque quem detêm as rédeas do poder, ou as pessoas que guiam o leme das finanças nacionais, não consegue, ou não tem o menor interesse, de equilibrar a divisão do dinheiro que é introduzido no país com o esforço da coletividade. Disso resulta o desnivelamento que acomete apenas as camadas historicamente desfavorecidas de saúde, de segurança e, sobretudo educação.
Como um cidadão conseguirá entrar nesse rumo de transformação social, pelo qual a nossa economia está passando, se ele não tem as mínimas condições de concorrer a uma simples vaga de emprego, visto que os governantes não lhe deram a oportunidade de se preparar para tal? A resposta é simples, não conseguirá. Ele, como muitos outros, ficará estagnado na sociedade, exercendo alguma função maquinizada, ou seja, que não exija muita reflexão para ser executada. Isso, é claro, se ele não for fisgado antes pelo bicho da marginalidade, o qual dia após dia captura para o seu cativeiro pessoas com o sonho de mudar de vida e, depois de esquecidas pelos nossos governantes, acabaram frustradas, servindo de lenha para criminalidade.
Falar em um país de todos só seria devidamente coerente se a segurança pública estivesse quase que totalmente comprometida na proteção do povo e não fosse desviada para a cratera da corrupção, muitas vezes atraída pela cobiça de dinheiro fácil. Dizer que um país é de todos seria convincente se a saúde pública daqui fosse referência internacional, mas o que se vê são hospitais lotados, pessoas amontoadas em filas mendigando uma ficha para atendimento e profissionais mal remunerados, desestimulados, e quando não mal preparados para atender a desumana demanda dessas instituições.
Afirmar que um país é de todos seria verdadeiro se os serviços de saneamento básico e de água encanada chegassem a todas as residências desse Brasil, garantindo uma vida digna a cada pessoa que constitui essa nação. E proferir a falácia de que vivemos num país de todos é ignorar que a educação pública, tão importante para a construção, reflexão e transformação individual e coletiva da sociedade, está sendo posta de lado, paulatinamente falseada com dados mentirosos que tentam mascarar a verdadeira realidade do quadro de esquecimento e desrespeito da educação pública e, muitas vezes privada, nacional.
Por isso, é preciso que os governantes vistam a camisa, não com o título “Um país de todos”, mas sim “Um país para todos”. Para pobres e ricos, homens e mulheres, brancos e negros, jovens e idosos, héteros e gays, religiosos, deficientes, absolutamente para todos os que formam a pluralidade de vida existente nessa nação. Estamos cansados de sermos enganados com falsas promessas de mudanças que são lindas em discursos, mas na prática não são realizadas. O povo quer ação concreta, imediata. Quer ver a transformação acontecer por baixo, com aquele menino da favela sem perspectiva de futuro, com aquele homem que vive isolado pela seca do nordeste brasileiro, pelas mulheres que lavam suas roupas sujas no curso do rio São Francisco, pelos povos que vivem isolados nas longínquas terras amazônicas desse país. Ou seja, o povo quer, precisa, e tem o direito de ver as reais mudanças acontecerem agora.
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