Pelo fim da homofobia, pelo fim da violência


Passear pela calçada de uma rua, em plena luz do dia, pode ser muito perigoso, pois a qualquer momento alguém é capaz de deferir um ataque surpresa, mesmo sem razões aparentes. Demonstrar afeto entre pai e filho também é muito arriscado, uma vez que a orelha de um deles pode ser cortada. Andar de mãos dadas pelas ruas não é um ato tão singelo como parece, porque, dependendo da reação das pessoas, o casal que ousar cometer esta “infração” pode ser severamente penalizado. Essas eufêmicas representações do nosso cotidiano dizem respeito aos ataques sofridos pelos gays durante a ascensão da homofobia no cenário brasileiro. De dia, de noite ou de madrugada, vários homossexuais sofreram, e ainda sofrem, com a fúria do preconceito de uma sociedade que ainda finge aceitar a homossexualidade. Fingimento porque há uma visão pormenorizada desse grupo que vai desde o caricato das novelas, com arquétipos afeminados e com pouco ou nenhuma carga ideológica. Passando até ao perfil transgressor das travestis e transexuais, repudiados, sobretudo pelas camadas mais conservadoras.

Xingamentos, tapas, socos, facadas, tiros, mortes, estas foram às palavras bordadas a sangue no manto da intolerância, vestido forçosamente pelos gays do Brasil durante o ano de 2011. Em tal período, a comunidade LGBTT presenciou seus iguais serem brutalmente feridos em várias partes desse país, mesmo sem saberem ao certo a razão para tamanha selvageria. De braços amarrados pela falta de políticas combativas, no que se refere principalmente a este cenário de horror, os homossexuais até tentaram impelir uma possível posição em defesa das suas causas, com a aplicação do aclamado, mas infame PLC 122, projeto do qual criminalizaria a homofobia por aqui. No entanto, depois de várias idas e vindas, tal projeto vagueia entre os políticos brasileiros, sofrendo inúmeras mudanças depreciativas para os gays, e favorecendo, por outro lado, grupos hipócritas e de ideologias duvidosas que preferem segregar a ter que ampliar os direitos de todos os cidadãos, independente da orientação sexual destes.


Parte integrante do comportamento de todas as sociedades, a homossexualidade amarga a rejeição de um povo que tem como padrão a heterossexualidade revestida de heteronormatividade, ou seja, de regra a ser cumprida à risca, sob pena de sofrer na pele, literalmente falando, o dissabor de tal transgressão. Essa educação sexista é a principal culpada pela propagação da violência contra os gays aqui no Brasil. Isto porque, o modelo educacional da nação, neste sentido, é falho, no que tange a um método que vá além das questões meramente fisiológicas, já que desde cedo se aprende que há meninos e meninas, cada um com modelos estáticos a serem seguidos, da infância até o fim da vida. Essa visão limitada acaba deixando de lado toda a pluralidade da sexualidade humana, a qual não está estagnada às genitálias. Este erro faz com que o diferente não seja visto com naturalidade, o que ocasiona a rejeição, da qual lentamente forma uma feroz avalanche de preconceitos. Dito de outra maneira, estamos produzindo, nas escolas e dentro de casa, futuras maquinas de matar.


Outro culpado disso tudo é um personagem que costuma levar a fama de bom samaritano, por ser responsável pela divulgação massiça da homossexualidade em rede nacional, a mídia televisiva. Sejam em programas de auditório, com quadros específicos sobre a causa LGBTT, sejam nos alegres programas de humor, com seus personagens muitas vezes caricaturados, os gays se fizeram presentes na TV durante o último ano. Sem contar as inúmeras interpretações de homossexuais nas telenovelas, o que deveria ser o inicio de um progresso para esse grupo tão hostilizado socialmente. Entretanto, lamentavelmente as abordagens dadas à homossexualidade pecam por não trazerem a tona subsídios concretos em defesa da causa deles. Contraditoriamente, num país onde o dinheiro público é desviado escancaradamente e a educação pública fingi ser de qualidade, o vergonhoso mesmo é mostrar um casal gay se beijando. O que deveria ser uma pouca vergonha é a falta de caráter de alguns políticos e não uma singela demonstração de afeto. Por causa destas distorções a violência continua a avançar contra o segmento gay do país.


Na verdade, muitos tentam justificar a violência contra os homossexuais, partindo daquele fadado conceito do qual diz que a prática sexual entre iguais contraria as leis naturais do homem, indo de encontro às leis divinas. Esse argumento é muito proferido pelas camadas mais conservadoras, sobretudo as evangélicas, uma vez que elas acreditam que a homossexualidade seja uma abominação e que deve ser contida para que a naturalidade da vida não sofra uma possível interrupção. De forma velada, os adoradores de Cristo acabam contribuindo para a disseminação da homofobia. Em seus discursos palavras como pecado, inferno e anormal soam, para a nossa sociedade iletrada e cognitivamente desfavorecida, como verdadeiras armas de matar. Ou seja, ao invés de espalhar a união entre as pessoas, baseado no amor de Deus, eles, os evangélicos, estão paulatinamente, espero que inconscientes, germinando a violência contra os homossexuais. Tudo porque os gays, para eles, infringem o sagrado, o divino.

Divinal mesmo é o amor em sua total plenitude. Também é o respeito pelo próximo, a tolerância entre aqueles que por alguma razão são diferenciados. Divinal é o sentimento de companheirismo entre os seres humanos, independente se são iguais ou diferentes. É ser aberto a compreender que na vida não se escolhe ser gay ou hétero, magro ou gordo, branco ou negro, homem ou mulher, apenas se é o que é, numa continua construção de caráter e identidade. Ser divinal, neste contexto, não quer dizer ser imoral, porque se amar e querer bem são sinônimos de imoralidade, então esta palavra está sendo erroneamente utilizada. O que é realmente imoral é a violência velada, é o preconceito infundado que fomenta as discriminações mais insólitas. É a nossa falta de compaixão em entender os problemas dos excluídos no intuído de melhorá-los. Isso sim é vergonhoso, pois fere a principal condição humana, o amor. Portanto, para este ano, considerado por muitos como cabalístico e divisor de uma nova era, vamos exterminar qualquer manifestação de violência, sobretudo aquelas ligadas à sexualidade. Todo mundo tem o direito de ser feliz da maneira que lhe foi predestinado e ninguém tem o direito de intervir nisso. O amor, a igualdade e o respeito devem prevalecer daqui para frente.

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